Ilustração: Mônica Ramona
Camila
sempre foi a mulher mais linda do mundo(pelo menos do meu mundo era). Desde
pequena atraia todos os olhares por onde passava. Certa vez a mãe a levou para
passear no parque e ela foi correndo para o coreto e começou a cantar. Não era
dessas canções que vocês jovens escutam hoje sem pé nem cabeça, mas era
daquelas que faz bem aos ouvidos e acalma o coração.
Acordei bem cedo naquela manhã de
final de verão ou ainda era noite? Difícil dizer ao certo porque as vezes
parece que as horas passam devagar e quando paramos pra olhar ao redor já
vivemos anos. Levantei, calcei os chinelos (o que as pessoas costumam chamar de
pantufas, mas são chinelos de qualquer forma) e fiquei olhando pela janela uns
instantes. Pensei em como o dia estava lindo e desci as escadas para tomar meu
café da manhã.
A noite chegou rápido. Camila estava
lá novamente com seus grandes olhos e longos cabelos ruivos. Ela era tão linda!
Sua pele branca fazia contraste com seus cabelos alaranjados. Sempre imaginava
que, se fosse em tempos passados, ela teria sido acusada de bruxaria ou algo do
tipo. Depois repensei e admiti pra mim mesmo que seria quase impossível pensar
em fazer algo tão macabro com aquele lindo rostinho.
Outro amanhecer, levantar, calçar os
chinelos, olhar pela janela, descer a escada e tomar o café. Fiquei bons
minutos sentado na cozinha tomando meu chá na minha caneca preferida (meu chá
porque eu realmente não sou muito fã de café). Pensei em como os passarinhos
estavam felizes e jovens, confesso que fiquei com uma ponta de inveja disso
tudo. Terminei meu chá e fui ler meu livro.
Finalmente noite. Eu adorava as
noites mais do que olhar pela janela, do que minha caneca preferida e do que
aquele livro era realmente ótimo. Foi a primeira vez que ela falou comigo no
baile da 8ª série. Ela estava linda (como não estar linda se ele sempre foi
linda?), com aquele vestido preto que deixava seus cabelos longos em evidência
e sim sou totalmente apaixonado por ela e seus cabelos alaranjados. A olhei a
noite inteira e em um determinado momento ela veio em minha direção. Parou na
minha frente. Me olhou fundo nos olhos. Não disse nada. Eu esqueci como se
respirava.
Dessa vez acordei meio perturbado,
acho que minha asma estava atacando novamente. Meus médicos disseram que o ar
puro do campo me faria bem, mas quando a idade chega não há ar puro que nos
torne jovens novamente. Gostava da casa que comprei a poucos quilômetros da cidade
e ainda tinha um lindo lago na frente, fiquei me perguntando porque não havia
mudado anos atrás. Tomei alguns remédios e finalmente passou o mal estar.
Levantei, chinelos, janela (conclui
que talvez poderia chover essa noite). O dia foi rotineiro, chá, livro, banho
quente, dormir...
Ela me olhou, minha garganta deu um
nó e eu não sabia o que dizer. Estendi a mão e fomos dançar. O toque das minhas mãos nas dela foi a melhor coisa que senti na minha vida, não trocaria aquele
momento por nada nesse mundo. Depois de anos em que a olhava sem falar nada
esta foi a primeira vez que nos falamos. Ela sempre tão linda e doce e quando
eu olhava pra ela só podia pensar numa palavra “perfeição”. No fim da noite,
naquele dia 31 de um mês que eu não me recordo mais, o que de fato realmente
não importa, tive a certeza que ela era a mulher da minha vida.
Acordei no meio da tempestade com
meu ataque novamente. Virei para a mesa ao lado da cama em busca dos meus
remédios e nada. A chuva só aumentava lá fora, dei uma olhada rápida pela
janela, estava completamente escuro. Me revirei tentando encontrar forças para
ficar de pé. Não as encontrei.
Quando desisti encarei o teto. Tudo
ficava mais escuro. Queria dormir novamente e sonhar com ela , assim como fazia todas as noites. Fixei meu
olhar num ponto qualquer do quarto (não fazia diferença agora) e me lembrei da
primeira vez que saímos juntos, do pedido de casamento, na casa dos sonhos,
viagens, do câncer, na luta, no fim... Meu coração começou a ficar escuro como
o dia lá fora. Desejei que no final não fosse assim pra ela. Lembrei que mesmo
quando seus cabelos caíram e seus olhos não tinham o mesmo brilho, que mesmo
assim, eu a amava tão intensamente ou até mais do que a primeira vez, mais do
que qualquer outro poderia amar.
A escuridão começou a adentrar o
quarto sem pedir licença. Eu não queria que o final fosse preto. Então, como um
milagre, eu agora só conseguia ver o alaranjado e finalmente tudo passou.
Por: Mônica Ramona
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